Organização
O papel da Guarda Municipal na segurança pública
A realidade desta instituição e o Estatuto Geral das Guardas Municipais – Lei n° 13.002 de 2014.
Resumo: O presente artigo tem como objetivo principal analisar a participação da Guarda Municipal como parte do sistema de segurança pública. É sabido que na prática a atuação desta instituição não se limita apenas ao disposto no texto constitucional, sendo muito mais diversa, colaborando
efetivamente com a manutenção da ordem pública. A Lei nº 13.022 veio ratificar e dar legitimidade a esta atividade que a cada dia se mostra mais essencial, não se limitando ao caráter meramente patrimonial.
Palavras – chave: Guarda Municipal. Segurança. Constituição. Estatuto.
1. Apresentação
No ano de 2014, a Presidente Dilma Roussef sancionou a Lei 13.002 que estabelece normas gerais para as Guardas Municipais, regulando o parágrafo 8º do artigo 144 da Constituição Federal.
Com a implementação do Estatuto e a ampliação das atribuições, abriu-se um debate sobre as competências desta instituição.
Nos últimos anos, o município passou a ter maior destaque na discussão sobre segurança pública e prevenção da violência por tratar, justamente, da esfera governamental mais próxima dos problemas cotidianos enfrentados pelos cidadãos.
A controvérsia a respeito das competências da Guarda Municipal vem acontecendo também perante o âmbito judicial em virtude da sua criação ser facultativa na Carta Magna, além da proteção aos Bens, Serviços e instalações Públicas. No entanto, a Constituição Federal concede aos Municípios a faculdade de legislar sobre assuntos de interesse local e, na prática, a atuação dessas instituições já é uma realidade na segurança pública.
Diante deste novo cenário, diversos municípios brasileiros repensaram suas políticas sociais e de segurança, buscando agregar uma medida de prevenção da violência por meio da implementação de políticas integradas no nível local. Neste contexto, a Guarda Municipal ganha destaque na construção e reformulação da segurança pública.
2. Breve histórico
As Guardas Municipais ou, Guardas Civis Metropolitanas, surgiram no Brasil no período feudal e tinham a incumbência de proteger as propriedades e zelar pela segurança das cidades.
O Regimento de Cavalaria Regular da Capitania de Minas Gerais, organizado em 09 de junho de 1775, ao qual pertenceu o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, foi a primeira instituição policial remunerada pelo erário. Essa corporação é considerada como predecessora da Guarda Municipal Permanente.
Com a chegada da Família Real Portuguesa no Brasil, em 13 de maio de 1809 foi criada a Divisão Militar da Guarda Real de Polícia, embrião da Guarda Municipal do Rio de Janeiro.
Ao deixar o trono, Dom Pedro I incumbe ao seu filho o destino do país e, neste momento conturbado, por meio da Regência Trina Provisória, em 14 de junho de 1831 é criada de fato com esta denominação em cada Distrito de Paz a Guarda Municipal, dividida em esquadras.
Em 18 de agosto de 1831, é publicada a lei que estabelece a Guarda Nacional e extingue no mesmo ato as Guardas Municipais, Corpos de Milícias e Serviços de Ordenanças.
Em 10 de outubro do mesmo ano, através de Decreto Regencial, foram reorganizados os corpos de municipais, agora incorporados ao Corpo de Guardas Municipais Permanentes, nova nomenclatura da Divisão Militar da Guarda Real de Polícia, subordinada ao Ministro da Justiça e ao Comandante da Guarda Nacional. No mesmo documento, os Presidentes das demais províncias foram autorizados a também criarem suas Guardas.
O Corpo de Guardas Permanentes teve destaque desde a sua concepção. Desdobravam-se entre o policiamento da cidade e a participação em movimentos armados ocorridos nos demais pontos do território brasileiro.
Durante o período militar as guardas foram praticamente extintas, devido à transferência da competência da segurança pública para os Estados. Voltaram à cena na Constituição de 1988 com o fim de proteger bens, serviços e instalações.
Ao longo desses duzentos anos, é possível afirmar que a evolução das Guardas Municipais acaba se confundindo com a própria história da Nação. Em muitos momentos esta força se destacou vindo a originar novas instituições em consonância com o momento político vigente. Com a missão principal de promover o bem social, esta instituição esteve desde o princípio diretamente vinculada à sua comunidade, foi e é um reflexo dos interesses da população.
3. Considerações sobre o papel das Guardas Municipais e sua atuação
3.1 Organização
As Guardas Municipais foram reestruturadas a partir do art. 144, parágrafo 8º, da Carta Magna de 1988, que faculta aos municípios a sua criação.
De acordo com Ventris (2010, p. 91), podemos definir a Guarda Municipal como uma “Instituição Pública Municipal, uniformizada, hierarquizada, desmilitarizada, armada ou não, de criação constitucionalmente facultativa, por iniciativa exclusiva do Executivo Municipal”. Frisamos que esta instituição deve ser criada por meio de lei, para agir na prestação de serviços no âmbito da segurança pública municipal e no contexto da preservação da ordem pública.
Possuem poder de polícia administrativa para agir em situações onde o cumprimento das leis municipais se faz imperioso, em casos de ameaça à ordem ou à vida e em situações de calamidade pública. Atuam também em qualquer outra situação de flagrante delito (de acordo com o artigo 301 do Código de Processo Penal), casos onde qualquer um do povo pode deter e as autoridades policiais e seus agentes devem prender quem quer que seja encontrado nessa situação.
Portanto, mesmo que haja divergências sobre a ação das Guardas Municipais em atividades de competência das polícias (Civil e Militar), esta estará amparada legalmente (tanto nas leis penais, como nas leis municipais).
Em geral, sua organização administrativa diverge entre um e outro município.
3.2 A Lei 13.022 de 08 de agosto de 2014
Primeiramente, pode-se dizer que o Estatuto Geral das Guardas Municipais conferiu de fato o poder de polícia e porque não dizer, polícia ostensiva, pois resumidamente, os agentes estão autorizados por lei a auxiliar na manutenção da ordem pública.
Por meio desta norma infraconstitucional, os municípios passaram a ter a opção de possuir responsabilidade direta sobre a segurança, ampliando a compreensão acerca do trabalho exercido por estas corporações.
Em uma rápida leitura do artigo 144 da Lei Maior, percebe-se que mesmo ao retirar as Guardas Municipais do rol taxativo que estabelece o dever de segurança, o legislador permitiu que os municípios criassem suas guardas visando a proteção de seu patrimônio, como se vê:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I – polícia federal;
II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal;
IV – polícias civis;
V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.
(…)
Parágrafo 8º Os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Através da leitura constitucional, é possível compreender o município como colaborador por meio de políticas públicas voltadas para a área de segurança e é neste contexto que está inserida a Guarda Municipal.
Como já exposto, a Lei 13.022 só vem validar o que já estava sendo praticado em diversas cidades brasileiras, nos quais as respectivas guardas já estavam sendo utilizadas no policiamento ostensivo e preventivo, dentro de suas capacidades, até mesmo sendo posicionadas em eventos como carnaval e outras festas populares.
A realidade mostra que esta instituição já cumpre as funções características dos órgãos estaduais e federais. A redação legal é clara quanto aos novos princípios das guardas, dentre os quais estão a preservação da vida, patrulhamento preventivo, uso progressivo da força (artigos 3º e 4º da Lei 13.022):
DOS PRINCÍPIOS
Art. 3o São princípios mínimos de atuação das guardas municipais:
I – proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e das liberdades públicas;
II – preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição das perdas;
III – patrulhamento preventivo;
IV – compromisso com a evolução social da comunidade; e
V – uso progressivo da força.
CAPÍTULO III
DAS COMPETÉNCIAS
Art. 4o É competência geral das guardas municipais a proteção de bens, serviços, logradouros públicos municipais e instalações do Município.
Parágrafo único. Os bens mencionados no caput abrangem os de uso comum, os de uso especial e os dominiais.
Art. 5o São competências específicas das guardas municipais, respeitadas as competências dos órgãos federais e estaduais:
I – zelar pelos bens, equipamentos e prédios públicos do Município;
II – prevenir e inibir, pela presença e vigilância, bem como coibir, infrações penais ou administrativas e atos infracionais que atentem contra os bens, serviços e instalações municipais;
III – atuar, preventiva e permanentemente, no território do Município, para a proteção sistêmica da população que utiliza os bens, serviços e instalações municipais;
IV – colaborar, de forma integrada com os órgãos de segurança pública, em ações conjuntas que contribuam com a paz social;
V – colaborar com a pacificação de conflitos que seus integrantes presenciarem, atentando para o respeito aos direitos fundamentais das pessoas;
VI – exercer as competências de trânsito que lhes forem conferidas, nas vias e logradouros municipais, nos termos da Lei no9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro), ou de forma concorrente, mediante convênio celebrado com órgão de trânsito estadual ou municipal;
VII – proteger o patrimônio ecológico, histórico, cultural, arquitetônico e ambiental do Município, inclusive adotando medidas educativas e preventivas;
VIII – cooperar com os demais órgãos de defesa civil em suas atividades;
IX – interagir com a sociedade civil para discussão de soluções de problemas e projetos locais voltados à melhoria das condições de segurança das comunidades;
X – estabelecer parcerias com os órgãos estaduais e da União, ou de Municípios vizinhos, por meio da celebração de convênios ou consórcios, com vistas ao desenvolvimento de ações preventivas integradas;
XI – articular-se com os órgãos municipais de políticas sociais, visando à adoção de ações interdisciplinares de segurança no Município;
XII – integrar-se com os demais órgãos de poder de polícia administrativa, visando a contribuir para a normatização e a fiscalização das posturas e ordenamento urbano municipal;
XIII – garantir o atendimento de ocorrências emergenciais, ou prestá-lo direta e imediatamente quando deparar-se com elas;
XIV – encaminhar ao delegado de polícia, diante de flagrante delito, o autor da infração, preservando o local do crime, quando possível e sempre que necessário;
XV – contribuir no estudo de impacto na segurança local, conforme plano diretor municipal, por ocasião da construção de empreendimentos de grande porte;
XVI – desenvolver ações de prevenção primária à violência, isoladamente ou em conjunto com os demais órgãos da própria municipalidade, de outros Municípios ou das esferas estadual e federal;
XVII – auxiliar na segurança de grandes eventos e na proteção de autoridades e dignatários; e
XVIII – atuar mediante ações preventivas na segurança escolar, zelando pelo entorno e participando de ações educativas com o corpo discente e docente das unidades de ensino municipal, de forma a colaborar com a implantação da cultura de paz na comunidade local.
Parágrafo único. No exercício de suas competências, a guarda municipal poderá colaborar ou atuar conjuntamente com órgãos de segurança pública da União, dos Estados e do Distrito Federal ou de congêneres de Municípios vizinhos e, nas hipóteses previstas nos incisos XIII e XIV deste artigo, diante do comparecimento de órgão descrito nosincisos docaputdo art. 144 da Constituição Federal, deverá a guarda municipal prestar todo o apoio à continuidade do atendimento.
4. Considerações Finais
Mesmo que se fale em inconstitucionalidade da referida lei (por suposta violação aos preceitos fixados no artigo 144 da Constituição), até o presente momento ela se mostra em justa adequação à realidade brasileira.
Com a onda de violência que assola o país, o modelo de segurança outorgado apenas aos Estados Membros e União se mostra obsoleto e os municípios através de suas Guardas já participam da segurança pública de fato, sem que isso se caracterize como usurpação de função.
Infelizmente, é possível notar que estas corporações enfrentam obstáculos devido à falta de padronização no território brasileiro, mesmo com um estatuto vigente.
Assim, conclui-se que o trabalho das Guardas Municipais não se limita ao caráter de proteção ao próprio municipal (pois é assim que grande parte da população a enxerga), em razão da amplitude das suas atribuições no texto legal e de sua proximidade com o povo local, seguindo uma tendência de municipalização da segurança pública, como bem executado em alguns países de primeiro mundo.
5. Referências
Histórico das Guardas Municipais no Brasil. Fonte: Pdfhttp://www.twiki.ufba.br/twiki/bin/viewfile/PROGESP/ItemAcervo306?rev=&filename
VENTRIS, Osmar. Guarda municipal: Poder de policia e Competência. 2. Ed. São Paulo: IPECS, 2010.
Lei 13.022/14. Fonte: www.planalto.gov.br
Constituição Federal do Brasil. Fonte: www.planalto.gov.br.
Portal das Guardas Municipais. Fonte: http://www.guardasmunicipais.com.br/
Fonte: https://amandagrey.jusbrasil.com.br/